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OBRAS IMPORTANTES DE GUIGNARD EM DESTAQUE
COM A ANÁLISE DO PROFESSOR PIERRE SANTOS
Serra da Bocaina em Itatiaia, 1940, 002-40, 37 X 53 cm.
Este foi o primeiro quadro pintado em Itatiaia por Guignard. De pé atrás do cavalete já montado, tudo preparado, a mão direita sobre o coração, eis o pintor namorando a paisagem que pretendia conquistar, tendo antes que demonstrar-lhe admiração, interesse e carinho, na tentativa de melhor entendê-la. Entendê-la: este era o primeiro problema a ser resolvido. Por isto, Guignard ficou um tempo mais ou menos longo estudando o motivo em seu conjunto. Uma vez tendo-o incorporado, quis saber por onde começar – momento agônico de todo artista para o acionamento da obra – e por instantes se sentiu em dúvida. Mas quando compreendeu que as cores modelavam os morros internos, além vegetação e aquém Bocaina, em aguadas sutis dispostas em manchas tênues e suaves, o pintor se soltou em seus gestos, procurando obter o mesmo efeito na tela. Foi passando com leveza os pincéis ali naqueles morros previamente esquematizados, como se tivesse na ponta das cerdas, não pigmentos, mas veludos de ricas e variadas tonalidades. Aí, esforçou-se por manter o mesmo efeito de suavidade e menor variedade de tons, devido à distância, na parede inclinada da Serra, desde os morros menores até à sua característica silhueta, obtendo o necessário contraste de definição entre a vegetação de primeiro plano e o complexo montanhoso, que se eleva até à metade da superfície, bem como de toda essa parte intermediária com o céu cheio de nuvens.
Hoje, ao vermos esta pintura e deixarmos nossa visão viajar ali pelo céu, ficamos com a sensação exata de que essas nuvens avançam sobre nossas cabeças de modo adelgaçado e, não demora muito, irão se perder atrás do horizonte, lá na retaguarda. Este efeito foi muito bem estudado por Guignard nos museus europeus, que visitava, em quadros de artistas barrocos e pós barrocos, como Ruysdael, Vermeer, Lorrain e Canaleto, mas, sobretudo, em paisagistas ingleses, como Gainsborough e Bonington, e, acima de tudo, Constable e Turner – cujas obras conheceu e estudou com muito interesse.
Retomando o assunto, a paisagem solucionada daquela maneira descrita já era de surpreendente síntese, ficando para o céu e a vegetação a função descritiva, e a poética, para o miolo. Guignard naquele momento viu que poderia chegar a uma síntese lírico-expressiva ainda mais intensa, mas não naquele quadro. Ele já estava pronto e era belo! Mas seria exatamente aquele miolo que lhe haveria de proporcionar uma ventura plástica mais corajosa, como veremos adiante. Por enquanto, ele se sentia satisfeito. Olhava para a paisagem infinita à sua frente, olhava para o pequeno quadro belamente colorido, onde ela estava fixada, e se perguntava qual das duas era mais bonita, coisa que não tinha a menor importância, pois sabia que, ao longo do tempo, tudo ali, naquela natureza tão exuberante em todos os seus aspectos, haveria de mudar-se, mas aquele momento ali visualizado e apreendido ficaria para sempre testemunhado e imutável na fixidez daquela pintura.
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