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OBRAS IMPORTANTES DE GUIGNARD EM DESTAQUE
COM A ANÁLISE DO PROFESSOR PIERRE SANTOS
Natureza morta, déc. de 20, 028-00, osm, 39 X 51 cm.
Esta Natureza morta é um dos quadros mais antigos de Guignard. Embora sem data, deve ter sido pintada em meado do ano de 1922, em Florença, onde o bolsista cumpria cursos de aperfeiçoamento na Academia local durante aquele período.
Frutas, folhas e objetos estão dispostos em primeiro plano, sobre um tampo de mesa, próximo a larga janela aberta para uma paisagem de bairro de periferia. Surpreendentemente, este céu que aí é mostrado, cheio de nuvens multicoloridas, enlaçando à esquerda o pico mais alto, é o tipo de céu o qual se tornou ‘marca registrada’ de nosso artista, que, no futuro, iria usá-lo em inúmeras pinturas. O mais surpreendente é que, estando aí já tão bem definido, não seria a primeira vez a ser usado, ao que tudo indica. À esquerda, descansando num cavalete, está um quadro (único lugar onde o pintor pôs a assinatura, mas não a data) com tema alegórico de amor (corações interligados por singelas flores) e larga moldura decorada pelo próprio artista. Certa vez, Guignard falou sobre um quadro cheio de pequenas flores e corações vermelhos que, após a bolsa de Florença, levou consigo para Munique e o entregou de presente a Anna Döring, de quem ficou noivo. Teria sido este? Ainda a respeito do quadro que aí aparece posto num cavalete, é interessante observar que pinturas assim bastante alegóricas, de temas aleatórios e soltos, com forte colorido, eram muito do gosto de alguns fovistas, como Dufy e Matisse, e Guignard, no futuro, iria usar sempre os recursos nele encontrados em cartões de natal e de aniversário, que adorava mandar para as mulheres pelas quais ia se apaixonando na vida.
Todas as formas deste quadro estão submetidas a ligeira deformação, recurso aprendido principalmente na observação de pinturas expressionistas do Die Brücke, que assim era empregado para acentuar a expressão do que, a cada obra, pretendiam os seus componentes passar. Todas elas também estão limitadas por forte traço escuro, dando evidência ao seu contorno, recurso este aprendido com os fauves franceses, principalmente com Rouault, de quem foi aluno. As cores desta pintura, de maneira geral, estão mais próximas de suas tonalidades mais escuras, frias e sem transparência. Seria influência da luz plenária europeia, sempre carregada? Todas as pinturas feitas por Guignard no Velho Continente apresentariam este aspecto? Quero crer que não e as marinhas realizadas no sul francês, por exemplo, seriam mais vibrantes de luz.
A composição está repleta de formas: tampo de mesa, folhas, cinco frutas, tocheiro, pote de incenso, quadro emoldurado, folha de veneziana esverdeada, várias casas de estilo toscano com seus telhados vermelhos, extenso campo em aclive até à fralda dos montes, pico e nuvens. Todas estas formas sem exceção, no que pesem as superposições, estão descritas em perfeita ordem, sem coisa alguma que nos pudesse confundir, reunidas em rigorosa composição rítmica. A única forma que talvez nos pudesse causar algum desconforto é a pequena moldura à esquerda, sobre o tampo e ao lado da pera avermelhada, precisamente porque não saberíamos dizer onde está apoiada. Mas não seria algo feito de propósito pelo artista, como de vez em quando gostava de fazer, para criar o contraste com todo o resto aí posto de maneira bem firme?
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